Kirk Douglas

KIRK DOUGLAS, O SONHO E O AMARGO AMERICANO


Kirk Douglas desafiou o feroz e insano macarthismo, que perseguiu, proibiu e puniu artistas, cineastas e escritores no mundo do cinema nos anos 1950, ao convidar o escritor e roteirista Dalton Trumbo, um dos black-listeds, para ser o roteirista do clássico Spartacus (vencedor de quatro Oscars / 1960), de sua produção e dirigido por Stanley Kubrick. Resgatou assim, pela primeira vez, de modo ousado, um acusado de ser comunista, no triste período da caça às bruxas nos USA, dando-lhe a oportunidade do retorno ao trabalho e o devido crédito na tela do filme.
Foi também a persistência de Kirk Douglas que permitiu a realização do filme Um Estranho no Ninho (1975), de Milos Forman. Douglas atuou na encenação da história do livro de Ken Kesey no teatro, em 1963, quando comprou os direitos autorais para o cinema, abraçou o projeto e buscou durante mais de uma década recursos para a produção. Queria para si o papel do protagonista, posteriormente dado a Jack Nicholson, num filme que acabou sendo produzido por seu filho, Michael Douglas.
A figura de Kirk Douglas permeou o cinema americano, como grande ator que foi, além de produtor, e também como um líder democrata que transgrediu normas e preconceitos instalados em Hollywood. Tornou-se uma lenda como ator, e nome expressivo por suas ações voltadas à causas com comprometimento humanitário e de justiça.
Sua carreira, de mais de 60 anos e mais de 80 filmes, marcou obras importantes, alguns clássicos inesquecíveis, A Montanha dos Sete Abutres (Billy Wilder /1951), Assim Estava Escrito (Vincente Minnelli /1952), 20.000 Léguas Submarinas (Richard Fleischer /1954), Sede de Viver (Vincente Minnelli /1956), Glória feita de Sangue (Stanley Kubrick /1957), Duelo de Titãs (John Sturges /1959), Spartacus (Stanley Kubrick /1960), O Último Pôr do Sol (Robert Aldrich /1961), Sete Dias de Maio (John Frankenheimer /1964), Paris está em Chamas? (René Clément /1966), Movidos pelo Ódio (Elia Kazan /1969). Filmes que marcaram, pelas histórias narradas, direção e construção de personagens, e as atuações brilhantes de Douglas.
A Montanha dos Sete Abutres (The Big Carnival) é o favorito para muitos críticos, que encontram ali um dos mais impressionantes filmes já feitos sobre o jornalismo aético e amoral, a crítica implacável à imprensa oportunista e sensacionalista. O drama, o cinismo, a manipulação de emoções, Kirk no papel instigante do repórter Chuck Tatum, decadente, ardiloso e desonesto, em sua última chance de se agarrar na produção de sua última e cruel cobertura jornalística. Obra do mestre Billy Wilder, reverenciada e citada em muitos outros filmes que vieram depois, sobre o mesmo tema.
Filho de imigrantes judeus russos, Issur Danielovitch viveu 103 anos, de 1916 a 2020. Virou Kirk Douglas, encarnando um arco de personagens variados, marcantes, intensos, virtuosos, foi viking, baleeiro, boxeador, produtor de cinema, alcoólatra, jogador, escravo, gladiador, coronel, cowboy, xerife, pintor, jornalista, publicitário. Interpretou personas históricas e emblemáticas como Doc Holliday, Spartacus, Vincent Van Gogh. Personalizou nas telas, entre heróis e vilões, o sonho e o amargo do imaginário americano. Concorreu por 3 vezes ao Oscar de melhor ator, nos filmes O Invencível, como o ambicioso pugilista Midge Kelly (1949), Assim Estava Escrito, como o inescrupuloso produtor Jonathan Shields (1952), Sede de Viver, como o torturado e obsecado Van Gogh (1956). Ganhou o troféu Cecil B. DeMille no Globo de Ouro, em 1968, e o Oscar pelo conjunto da obra, em 1996.
Um dos últimos astros vivos da era de ouro do Cinema. Ator de carisma, estilo, presença dramática, absoluto domínio em cena. Princípios e valores fortes, fora e em torno dela.

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